Uma criança especial que deu origem ao nome do nosso Projeto.

Roger Cunha Rodrigues ★ 22/11/1985 | ✞ 30/10/1992.

O nome Roger Cunha -
O Patrono da Instituição

Nossa Instituição tem como linha de trabalho promover o Mundo Unido. Isso implica a formação de pessoas com atitudes novas diante da vida, uma fé renovada num Deus amantíssimo, portadoras de amor por todos no coração, protagonistas da solidariedade e promotores da Paz.

Esses ideais espirituais são oriundos do Movimento dos Focolares (movimento cristão fundado por Chiara Lubich, em Trento, Itália, na época da segunda guerra mundial) cujo objetivo é criar um Mundo Unido através da vivência dos valores do Evangelho. Tais pressupostos deram origem à Espiritualidade da Unidade.

O Centro Social Roger Cunha Rodrigues é uma ação social do referido Movimento.

Ao pensarmos em um nome para a Instituição, desejamos que fosse significativo e em sintonia com a Espiritualidade da Unidade.

Nossa busca se deteve ao conhecermos a história de um menino que, aos 4 anos de idade, fora diagnosticado com leucemia.

Em busca de tratamento especializado, a família mudou-se de Parintins para Manaus em meados de 1990.


Impressionava a todos que desse menino se aproximavam sua resiliência, fé e amor diante do sofrimento causado pelo longo período do tratamento para combater a doença.

Em sua curta trajetória de vida, não obstante o doloroso calvário (longas e repetidas internações, exames invasivos e aplicação de medicação de alto efeito colateral) a criança apresentava uma fortaleza inexplicável aos olhos humanos testemunhando uma profunda união com Deus, na pessoa de Jesus Cristo, a quem chamava de “amigo”.

Edificados por tal comportamento – que a todos servia de reflexão para uma reformulação de vida – percebemos que aquele menino era referência de amor e bondade para qualquer pessoa independentemente da faixa etária.

Ao se dar sua passagem para a outra vida, no dia 29/10/1992 (às vésperas de completar 7 aninhos, o que aconteceria em 22/11), decidimos, com a permissão de seus pais, adotar seu nome como patrono da Instituição.

Foi assim que aquele trabalho social que começou com o simples nome de “Escolinha” (inicialmente funcionava em barracão de dois cômodos, em um terreno cedido por um comunitário, nas proximidades do prédio atual) passou a chamar-se Escola Roger Cunha Rodrigues.

Roger era o patrono ideal para nossa instituição, pois sua vida refletia todos os valores do nosso trabalho. Desde então, contar a história dessa criança notável passou a ser uma práxis da Instituição a todos que nos conhecem presencialmente ou através das mídias sociais. Assim, tornamos acessível a todos o legado de Amor com que viveu nosso patrono.

Salientamos, no entanto, que a leitura desta história seja feita com os olhos da alma por não se tratar de uma biografia com grandes feitos humanos, mas de uma criança iluminada pelo Amor de Deus, deixando um rastro luminoso atrás de si.

Vejamos um pouco da história da família de Roger Cunha Rodrigues.

Roger nasceu em Parintins no dia 22 de novembro de 1985. A família era composta por 4 membros: o casal, João e Rosely, e Jéssica (dois anos mais nova que Roger).

Somente aos quatro anos de idade foi detectada uma doença grave, leucemia. Pela complexidade dos tratamentos, que deveriam ser iniciados imediatamente, o casal teve que se transferir de Parintins para Manaus.

Rosely já tinha algum contato com os membros do Movimento dos Focolares em Parintins. Chegando a Manaus, este contato se tornou mais intenso e foi espontâneo o inserimento deles em Famílias Novas (grupo de famílias desse Movimento).

A transferência não planejada mergulhou a família em graves dificuldades financeiras. O amor concreto dos membros dos Focolares da comunidade de Manaus os socorreu nas necessidades mais urgentes: alguém disponibilizou uma casa com o mínimo de dignidade, outro ajudou a encontrar um trabalho para João.

Aos poucos, a experiência da família de Roger era conhecida por todos que partilham a espiritualidade da unidade na cidade de Manaus.

A experiência de amor concreto feita pelos membros do Movimento dos Focolares ajudou o casal a crescer espiritualmente e consequentemente fez com que Roger estreitasse o relacionamento com Deus.

Mesmo não tendo uma formação específica, Roger “respirava essa atmosfera” vivida com a presença de Jesus entre seus familiares, enriquecida pela convivência com os membros da comunidade focolarina manauara.

Muitas vezes Roger mostrou atitudes concretas de ser pai e mãe espiritual dos próprios pais, ensinando-os qual deve ser a medida de fé e de relacionamento com Jesus.

A seguir, relatamos alguns episódios que transparecem uma grande alma de um ser tão pequenino e frágil. É isso que edifica.

Roger fala com Jesus como amigo íntimo, uma pessoa de sua mesma idade.

“Mamãe, vou lhe contar uma coisa que aconteceu hoje (21/10/1992), JESUS falou comigo dizendo que às vezes faço o que aborrece à senhora, ou à Jéssica (sua irmãzinha), ou quando não quero tomar os medicamentos, ficando aborrecido. ELE não gosta. Mas é tão suave o seu não gostar que me ajuda a recomeçar e sentir todo o seu amor por mim”.

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Imagem ilustrativa. Smstake Church

Experiência no HEMOAM- banco de sangue

Conta Rosely: um dos dias que levei Roger para os exames do controle da doença. A médica me disse que devia esperar um certo tempo, porque, pela aparência, ele devia fazer transfusão de sangue ou de plaquetas. Então ele caiu no choro.

Alguns minutos depois, ele parou de chorar ficando muito tranquilo e disse: “Hoje não vou tomar sangue porque disse para JESUS que não queria tomar sangue nas veias e pedi para ELE que me desse o Seu Sangue, pois, assim como ELE sofreu muito na cruz, ELE iria me compreender e fazer entrar em mim o seu sangue e não seria preciso tomar sangue nas veias. Por isso estou tranquilo”.

Quando a médica voltou disse que Roger não precisaria tomar sangue naquele dia.
Ele pulou de alegria e disse: “Eu não lhe falei, mamãe, que JESUS tinha me dado o Seu Sangue?!”.

Relacionamento de Jesus em meio na família

(O termo “Jesus em Meio” se baseia na palavra de Jesus no Evangelho que diz: “Onde dois ou mais estiverem reunidos em meu nome Eu estarei ali”.

A vida no amor recíproco realiza esta promessa e é desta forma que as famílias do Movimento procuram viver.

O relacionamento de JESUS em meio na família ajudou muito Roger, também quando estava internado no hospital, a ser exemplo de amor entre seus coleguinhas que possuíam a mesma doença.

Quando uma menina ia fazer tratamento (tomar sangue) dizia muitos palavrões. Roger comentava dizendo perceber a tristeza que JESUS sentia e, assim, para mudar o ambiente, procurava fazer muitos atos de amor concretos. Era notória a sua delicadeza pela harmonia.

Enquanto seus coleguinhas jogavam papel no chão, deixavam a cama desarrumada, Roger, para manter também um sinal aparente de sua harmonia no relacionamento com DEUS, procurava deixar tudo limpo, também a cama bem arrumada.

Com as enfermeiras no hospital

Uma das enfermeiras, logo no início, tratava mal Roger e as outras crianças. Alguns dias depois, foi se percebendo uma mudança nela pois passou a ser mais delicada com ele e com as outras crianças.

Uma delas dizia: ”Roger é uma pessoa muito especial, é especial…!”

Outra gostava de ir frequentemente até o seu leito porque dizia sentir-se bem, estando ali com ele.

A multiplicação dos pães e o milagre nas bodas de Caná

Conta Rosely que leram a parábola da multiplicação dos pães e os milagres das bodas de Caná. Comentando as parábolas ele disse: “É verdade, mamãe, JESUS não deixa faltar nada. Quando falta leite, logo ele pede a alguém e de repente o leite chega para nós. Falta água na rua, mas logo chega.

Até a casa, que a gente não tinha, ELE pediu a Márcio (o membro do movimento que cedeu sua casa para a família morar) que se transferisse para Belém para que a gente pudesse morar aqui. Ele muda tudo, dando a nós tudo o que nos falta”.

SUAVE SINTONIA

Conta-nos João: Uma noite cheguei do trabalho um pouco depressivo. Comecei a pensar em tudo aquilo que estava acontecendo conosco: minha esposa com meu filho no hospital, minha filha Jéssica com uma família que não conhecíamos bem e eu sozinho ali naquele quarto… Senti uma grande necessidade de buscar DEUS. Peguei a Bíblia, abri aleatoriamente em uma página e li. Não lembro do conteúdo do texto, mas aquilo serviu para introduzir uma conversa profunda, espontânea e sincera entre mim e DEUS.

No dia seguinte, como de costume naquele período, fui ao hospital para revezar com Rosely, que ficava com ele pela tarde e noite. Assim que cheguei, Rosely disse que ele, Roger, comentou que sabia que eu havia conversado com JESUS na noite anterior. Fiquei surpreso e ao mesmo   tempo muito contente. Afinal, aos poucos, começávamos a aceitar com naturalidade fatos desse tipo.

A “PORTA” QUE SE ABRE

Tantas vezes Roger precisou ficar em isolamento num apartamento. Ali, a sós com Rosely, sua mãe, confidenciava suas impressões mais íntimas. Uma delas aconteceu quando a porta, que estava entreaberta, abriu-se por si mesma, empurrada pelo vento. Ele disse: “Olhe, mamãe, a porta se abriu!” Ela disse que havia sido o vento. E ele, abrindo aquele sorriso maravilhoso: ”Não, mamãe, foi JESUS que entrou aqui conosco! Eu vi Ele (sic) entrar!” Rosely ficou impressionada e “meditava estas coisas em seu coração”.

AS BOLINHAS DE GUDE

Certa vez, como havia se manifestado uma melhora na saúde fomos ao shopping para levar Roger e Jéssica para passear um pouco, narra João. Visitamos um supermercado e logo os dois passaram a revirar os brinquedos e dizer-nos os de sua preferência. Jéssica queria uma boneca da Barbie e ele queria um cart, tipo Ferrari (daqueles que a criança senta e pedala para movê-lo). Veio todo contente dizer que já havia escolhido o que queria que comprássemos para ele.

Eu e Rosely trocamos um breve olhar e coube a mim a tarefa de dissuadi-lo. Procurei justificar que não podíamos comprar aquele carrinho. De início ele chorou muito; bateu o pé, insistindo. Pedi-lhe que procurasse outro brinquedo. Meio desconfiado, foi se afastando novamente para dentro do setor dos brinquedos, acompanhado de Jéssica. Daí a pouco chegou trazendo um pequeno objeto em uma de suas mãos. Chegou perto, mais alegre e disse: ”Papai, gostei muito dessas bolinhas! O senhor pode comprar?!”. Não só pude comprar como as guardo até hoje.

Apesar de ser criança e gostar dos objetos que achava interessante, parece que ele, naqueles quase sete anos de vida, sabia que o consumismo podia ser controlado e que, portanto, perdendo aquele seu desejo de posse do carrinho, dizia que é possível se divertir e ser feliz com as coisas simples da vida.

A partir daquele dia, todas as vezes que ia brincar, sempre incluía entre os outros brinquedos as tais bolinhas e, quando eu estava em casa, quase me forçava a brincar com ele.

Era sempre uma festa, porque, se por um lado eu queria aproveitar para “curtir” ao máximo aqueles momentos que eu estava em casa e ele fora do hospital, por outro, sabia que cada momento com ele era precioso, pela sua pouca perspectiva de vida. Era fácil fazer-se um com Roger.

(“Fazer-se um” é um termo usado no Movimento dos Focolares quando por amor nos colocamos ao lado do outro atento às suas necessidades. Estar junto com…)

O PROTETOR DO PAI

João relata: Quando eu estava de folga do trabalho, ficava como acompanhante (era o descanso semanal de sua mãe). Cada minuto junto àquele leito, era precioso e estreitava muito entre nós a união. Sabia que ali podia Ter sempre JESUS no meio.

Tantas vezes sofri quando ele precisava fazer coleta de células de sua coluna (sem anestesia geral, apenas tópica) ou nas coletas de sangue sempre difíceis, já que sua pele ficou endurecida e a perfuração era muito dolorida. Depois que se perfurava a pele, a outra tortura era localizar a veia, igualmente escorregadia e dura.

Estando tudo bem, as enfermeiras sempre vinham fazer as visitas de rotina. Todas gostavam dele e procuravam fazer brincadeiras para ajudá-lo a tomar os medicamentos prescritos pela médica.

Numa dessas visitas, uma enfermeira tirou uma brincadeira, insinuando assédio, em relação a mim. Imediatamente, ele sentou na cama e começou a xingá-la: “Sai daqui! Deixa o meu pai, sua chata!”

Ele desconhecia o meu passado, mas parece que tinha a exata noção do perigo que eu corria, sem a sua interferência.

Assim que ela saiu, ele me abraçou com força e demoradamente e cochichou ao meu ouvido: “meu papaizinho!”

A MANINHA

Não era só comigo e Rosely que tinha esse cuidado especial. Um dia uma amiga nossa deu-lhe um bombom (daqueles de época de páscoa). Ele ficou contente e em seguida disse: “Eu não vou comer tudo porque quero deixar um pedaço para minha maninha!” Porém, ela disse que ele podia comer, que ela lhe daria outro para levar para sua irmã. Então ele comeu e realmente guardou o outro.

CAMPEÃO EM AMAR POR PRIMEIRO

Não era só comigo e Rosely que tinha esse cuidado especial. Um dia uma amiga nossa deu-lhe um bombom (daqueles de época de páscoa). Ele ficou contente e em seguida disse: “Eu não vou comer tudo porque quero deixar um pedaço para minha maninha!” Porém, ela disse que ele podia comer, que ela lhe daria outro para levar para sua irmã. Então ele comeu e realmente guardou o outro.

Naquela noite eu estava de acompanhante. Na enfermaria do hospital universitário (HUGV), àquela época, não havia leito para acompanhantes, nem era permitido levar colchão ou objeto similar. Depois que ele tomou a medicação daquele horário e as coisas acalmaram, aproveitei para deitar um pouco no piso, embaixo do pequeno leito que ele ocupava.

Quando acordei, ele estava retornando do banheiro, carregando, com dificuldade, o suporte de soro com uma das mãos. Preocupado, perguntei por que não me chamou. Ele disse: “Papai, eu queria fazer xixi. Vi que o senhor estava dormindo e não quis lhe chamar, mas está tudo bem”.

Para mim aquela atitude dizia muito mais que o simples fato de não querer me acordar. Significava toda a sua sensibilidade e a concretude em amar o outro por primeiro.

São muitos os relatos dessa natureza feitos por quem conviveu com esse menino. Nisso se constitui o legado e a biografia do patrono desta Instituição. Uma alma que em tão pouco tempo encarnou todo Amor e fé com que nós todos da Instituição nos esforçamos para vivenciar através deste serviço que prestamos às crianças, adolescentes e às famílias da Comunidade onde estamos inseridos.

Oração espontânea e diária feita por Roger antes das refeições (juntava as mãozinhas e baixava a cabeça)

“Papai do céu, eu te agradeço pela vida, por tudo que nos destes: esta casa, este armário, este alimento, este banquinho, por tudo… Eu te agradeço, JESUS, porque me curaste! (Quando era liberado para passar o final de semana em casa, acreditava estar curado).

Eu sei que sofreste e que morreste por nós. Sei que te pregaram numa cruz e te mataram. Mas sei também que ressuscitaste e que agora tu estás vivo. TU ESTÁS VIVO! (Esta frase consta no seu epitáfio).

No hospital, JESUS, tu sabes que eu sinto muitas dores quando preciso tomar sangue e fazer exames. Mas ofereço tudo a TI, pois, sofreste mais do que eu. Te peço que Tu cures os meus amiguinhos que estão no hospital para eles saírem logo de lá”.

Imagem ilustrativa. Deposit Photos
(Este relato foi escrito originalmente por Juscelino Oliveira – então responsável pelo setor masculino do Movimento dos Focolares de Manaus – e lido no velório de Roger no dia 30/10/1992. Revisado em 08/06/20, por João Rodrigues, pai biológico de Roger Cunha).